É inadmissível que, apesar da proibição explícita da Anvisa sobre a comercialização e uso de cigarros eletrônicos, esses produtos sejam vendidos livremente por todo o Brasil. A fiscalização existente tem se mostrado insuficiente e ineficaz, conforme reconhecido pela própria Receita Federal em nota de esclarecimento recente, na qual admite que as apreensões representam apenas cerca de 10% do volume total estimado no mercado clandestino¹. Essa realidade expõe a gravidade da falha no controle de um produto que representa um risco claro à saúde pública, especialmente entre os jovens.
Além disso, o governo tem se mostrado mais interessado em discutir a arrecadação de curto prazo do que em implementar medidas rigorosas de fiscalização. Isso se evidenciou quando, em vez de fortalecer o combate à comercialização ilegal, houve pressão direta sobre a Anvisa para reconsiderar a regulamentação dos cigarros eletrônicos, com o intuito de explorar a tributação desses produtos². No entanto, essa lógica arrecadatória se prova falha quando comparamos os números do tabaco tradicional: em 2018, a arrecadação tributária sobre produtos de tabaco foi de R$ 12,9 bilhões, enquanto os custos relacionados ao tratamento de doenças atribuíveis ao fumo atingiram R$ 56,9 bilhões³.
Essa disparidade mostra claramente que a estratégia de regulamentação para fins de arrecadação resulta em um custo público muito superior aos ganhos fiscais. A legalização dos cigarros eletrônicos apenas ampliaria esse desequilíbrio, aumentando a disponibilidade do produto, reduzindo a percepção de risco entre os consumidores e, consequentemente, elevando os custos de saúde pública. O histórico do tabaco já nos mostrou que a tributação é incapaz de cobrir os danos gerados por essas substâncias.
Portanto, insistir na legalização dos cigarros eletrônicos para arrecadação é um erro que comprometerá ainda mais a saúde pública e as finanças do país. A atual ineficácia na fiscalização só será agravada caso se normalize a comercialização desses produtos. É essencial que o governo priorize a saúde dos cidadãos, investindo em uma fiscalização rigorosa e contínua, e não em estratégias de arrecadação que a longo prazo se mostram insuficientes para lidar com os prejuízos causados.
Rolf Hartmann
Presidente da Cruz Azul no Brasil
Referências Bibliográficas
¹ BRASIL. Receita Federal do Brasil. Nota de Esclarecimento – Receita Federal sobre o comércio de cigarros eletrônicos. Disponível em: https://www.gov.br/receitafederal/pt-br/assuntos/noticias/2024/setembro/nota-de-esclarecimento. Acesso em: 22 set. 2024.
² O ANTAGONISTA. Governo assume que pressionou Anvisa por liberação de cigarro eletrônico. Disponível em: https://oantagonista.com.br/brasil/governo-assume-que-pressionou-anvisa-por-liberacao-de-cigarro-eletronico/. Acesso em: 22 set. 2024.
³ FIOCRUZ. Relatório sobre o impacto econômico do tabagismo no Brasil. 2019.